O ruído é o maior responsável pela poluição sonora. Provocados pelo som excessivo das indústrias, canteiros de obras, meios de transporte, áreas de recreação e outros fatores, os ruídos geram efeitos negativos para o sistema auditivo, além de provocar alterações comportamentais e orgânicas.
Mas não só nas ruas existem poluição sonora e brigas por causa do barulho. Nas residências, elas também fazem parte do cotidiano, mas os agentes causadores são outros. Eletrodomésticos, instrumentos musicais, televisores e aparelhos de som precisam ser utilizados de forma adequada para não incomodar os vizinhos nem prejudicar a própria saúde.
Barulho de sapatos, reuniões familiares e até conversas em tom elevado entram para o rol das discussões. Para evitar esses problemas, alguns condomínios têm regras específicas. Em muitos prédios, há convenções que estabelecem como os moradores e visitantes devem se portar quanto a ruídos e outros barulhos.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao longo dos últimos anos, julgou diversos processos sobre poluição sonora.
Vibrações e ruídos
Quando o uso do imóvel é misto – comercial e residencial –, podem surgir problemas para o sossego dos moradores. Foi o que aconteceu num edifício em área comercial de Brasília. O proprietário e morador de uma quitinete ajuizou ação contra o condomínio, porque a empresa vizinha à sua unidade havia instalado, sobre o teto do edifício e acima de sua residência, equipamento que funcionava ininterruptamente, produzindo vibrações e ruídos que afetavam sua qualidade de vida.
Pediu que a empresa fosse proibida de utilizar o equipamento, além de ressarcimento pelos danos morais sofridos. O juízo de primeiro grau verificou que a convenção do condomínio estabelecia a finalidade exclusivamente comercial do edifício e que só havia barulho acima do tolerável no período noturno.
O morador apelou e o tribunal local condenou a empresa e o condomínio, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil. No curso do processo, o morador deixou o imóvel, por isso, o pedido de retirada do equipamento ficou prejudicado.
Inconformada, a empresa recorreu ao STJ. Afirmou que o morador residia irregularmente em imóvel comercial e que, por essa razão, não teria direito ao sossego e silêncio típicos de área residencial.
Uso misto
Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal superou as regras condominiais e reconheceu que, naquele edifício, havia uma área de uso misto. Ela verificou que o imóvel tinha sido anunciado como quitinete e, ainda, que a tarifa de luz e o IPTU eram cobrados como os de um imóvel residencial.
A ministra verificou, também, que o condomínio tolerou a utilização do edifício para fins diversos daqueles estipulados em sua convenção. “Se os próprios construtores do prédio anunciavam que certas unidades ali comercializadas poderiam destinar-se à habitação, todos, condomínio, adquirentes e locatários, não poderiam ignorar essa realidade”, afirmou, mantendo a indenização pelo dano moral (REsp 1.096.639).
Vizinhança
Pensando em melhorar a qualidade de vida dos grandes centros urbanos, leis do silêncio foram criadas para combater a poluição sonora. Essas leis partem da contravenção penal conhecida como perturbação do sossego, dos direitos de vizinhança presentes no Código Civil, das normas estabelecidas pela ABNT e do Programa Nacional de Educação e Controle de Poluição Sonora, que estabelecem restrições objetivas para a geração de ruídos durante dia e noite, em especial no caso de bares e casas noturnas.
Em cidades onde a legislação ainda não prevê limites e sanções, a solução para os problemas relacionados aos ruídos ainda depende do registro de boletins de ocorrência ou da intervenção do Ministério Público.
Competência
Se a poluição sonora afeta mais do que o vizinho de parede e chega a perturbar toda a vizinhança, pode-se considerar que o meio ambiente está sendo afetado e, nesse caso, o Ministério Público tem competência para atuar. O entendimento é das duas Turmas do STJ que analisam a matéria.
Num dos casos julgados pela Segunda Turma, o MP entrou com ação civil pública para interromper a poluição sonora causada por um bar localizado em área residencial. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), entretanto, entendeu que os interesses envolvidos seriam individuais, não difusos, porque afetos a apenas uma parcela da população municipal.
Ao julgar o recurso do MP, a Turma entendeu que o artigo 3º da Lei 6.938/81, que define o que é poluição e degradação ambiental, caracteriza poluição também como algo que prejudica a saúde, o bem-estar e a segurança da população. Por essa razão, os especialistas da área apontam a poluição sonora como um dos maiores problemas dos grandes centros urbanos. Assim, o MP tem legitimidade para dar continuidade à ação (REsp 1.051.306).
Mesmo entendimento teve a Primeira Turma ao concluir que o MP possui legitimidade para propor ação civil pública em defesa do meio ambiente, na hipótese de poluição sonora decorrente de excesso de ruídos.
Um caso julgado em agosto de 2008 no STJ dizia respeito a ação civil pública ajuizada pelo MP para interromper a poluição sonora causada por uma casa de oração. Segundo o órgão, o templo agredia deliberadamente o meio ambiente através da utilização de aparelhos sonoros de forma imoderada e irresponsável, colidindo frontalmente com as exigências impostas pela legislação ambiental.
Em primeiro e segundo grau, foi considerado que o MP não tinha legitimidade para propor a ação, posição revertida pelo julgamento na Primeira Turma (REsp 858.547).
Em outro caso, julgado cerca de um ano antes, a Primeira Turma já havia se posicionado no mesmo sentido. Na ação, o MP pedia que uma empresa ferroviária fosse obrigada a não produzir poluição sonora mediante a emissão de ruídos acima do permitido pela legislação pertinente.
Em primeira instância, o MP conseguiu liminar, mas houve recurso e o tribunal estadual extinguiu o feito sem apreciação do mérito, por entender que o MP não tinha legitimidade para a ação (REsp 725.257).
Perda auditiva
Os ruídos podem ser a causa de traumas indenizáveis. Um caso julgado pela Quarta Turma em 2004 tratava de um operário que havia perdido a audição durante o tempo em que trabalhou em local com excesso de barulho. Pediu indenização de uma seguradora de previdência privada, em que tinha seguro de vida em grupo e acidentes pessoais, mas a seguradora negou o pagamento. O operário, então, ajuizou ação, porém perdeu na primeira e na segunda instância.
Ao recorrer ao STJ, a Quarta Turma entendeu que os microtraumas provocados por ambiente inadequado de trabalho, gerando lesão auditiva, são, sim, acidente pessoal, portanto indenizável (REsp 280.253).
Crime contra o meio ambiente
A poluição sonora é tipo penal previsto na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98). Este tem sido o entendimento do STJ, confirmado em julgamento realizado em 2011 na Quinta Turma. Um homem acusado do crime impetrou habeas corpus pedindo o trancamento da ação penal, sob alegação de que a poluição sonora não foi abrangida pela lei.
A Quinta Turma, seguindo o voto da relatora, ministra Laurita Vaz, negou o habeas corpus por entender que a poluição sonora não é expressamente excluída do tipo legal.
Segundo a Turma, a Lei 6.938, ao dispor sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, em seu artigo 3°, ressalta que se entende como poluição qualquer degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente criem condições sociais e econômicas adversas e lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
“Desse modo, reconhecer a irrelevância do dano causado ou desclassificar a conduta para a contravenção penal de perturbação do sossego, como pretende o impetrante, ultrapassa os próprios limites do habeas corpus, sobretudo porque a denúncia, fundamentada em laudo pericial, afirma expressamente que a emissão de sons e ruídos acima do nível permitido trouxe risco, inclusive, de lesões auditivas a várias pessoas”, acrescentou a relatora (HC 159.329).
Insalubridade
A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que o som deve ficar em até 55 decibéis (db) para não causar prejuízos ao ser humano. Além dessa medida, os efeitos negativos começam a aparecer. Alguns podem ocorrer em curto prazo, outros podem levar anos.
Um incidente de uniformização sobre insalubridade de ruídos está sendo processado pelo STJ. A discussão gira em torno dos níveis de ruído considerados nocivos à saúde, para contagem de tempo especial e consequente conversão em tempo comum para efeitos de aposentadoria especial por tempo de serviço, além da exigência do laudo de insalubridade para a comprovação do tempo (Pet 9.059).
A questão foi sucitada pelo INSS depois que a Turma Nacional de Uniformização (TNU) decidiu um recurso de forma oposta ao que entende o STJ. A jurisprudência do Tribunal é bem clara no sentido de que o tempo de serviço é disciplinado pela lei vigente à época em que efetivamente prestado.
Assim, é considerada especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, até a edição do Decreto 2.171/97, sendo considerado prejudicial após essa data o nível de ruído superior a 90 decibéis. Somente a partir da entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18 de novembro de 2003, o limite de tolerância de ruído foi reduzido a 85 decibéis.
O caso ainda vai a julgamento na Primeira Seção.
Fonte: Coordenadoria de Editoria e Imprensa | http://www.stj.jus.br
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